O manejo é a resposta

O Brasil é um gigante em riquezas naturais e quando se tratam de espécies de árvores, quase que diariamente surgem novas opções comerciais de tipos de madeira. O potencial de aproveitamento dessas espécies para a realização de manejo florestal sustentável é o trabalho do pesquisador Evaldo Muñoz Braz. Evaldo se dedica há mais de três décadas no desenvolvimento e aplicação de adequadas práticas de manejo florestal e comenta sobre a evolução do segmento, a importância da pesquisa e as mudanças vistas na atividade ao longo dos anos.

CV

Evaldo Muñoz Braz é formado, mestre e doutros em engenharia florestal pela UFSM (Universidade Federal de Santa Maria), já participou de levantamentos florestais nos Estados do Amazonas, Acre e Roraima. Suas principais experiências são nas áreas de recursos florestais e engenharia florestal, com ênfase no manejo de florestas naturais na Floresta Amazônica.

FLORESTAL: Como surgiu seu interesse pela engenharia florestal?

EVALDO: Desde jovem tenho interesse pelo conhecimento sobre florestas. Em uma visita de divulgação do então curso científico, que antecederam às faculdades, houve a divulgação do curso de engenharia florestal em Santa Maria (RS). Essa divulgação foi feita por um dos fundadores do curso na cidade, o professor José Sales Mariano da Rocha. Através da apresentação, o interesse que já tinha aumentou e tomei a decisão de seguir na área.

FLORESTAL: Quais suas principais áreas de pesquisa?

EVALDO: Há muitos anos me dedico a pesquisa de manejo de florestas naturais. No início trabalhei com a pesquisa em exploração florestal, que hoje é chamado de colheita florestal. Atuei no Acre, na EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), junto ao pesquisador Marcos Vinicius para realizar o planejamento de redes de estradas no Estado. Além disso, trabalhei por muito tempo com inventários florestais. Hoje, posso dizer que minha área de pesquisa está muito fortalecida, principalmente pela parceria com a doutora Patrícia Póvoa de Matos, especialista em dendrocronologia. Essa parceria ajudou a desenvolver mais conceitos de manejo de florestas naturais e interpretar melhor os dados colhidos na floresta.

FLORESTAL: Com foi sua experiência lecionando em Moçambique?

EVALDO: Extremamente interessante. Antes de lecionar, trabalhei em uma empresa florestal do país, identificando as áreas para exploração florestal, que me ajudou a conhecer a realidade de Moçambique. Quando lecionei, pude ajudar na formação do curso de engenharia florestal em Moçambique. Eventualmente recebemos visitantes na EMBRAPA e há algum tempo tive a surpresa de receber um engenheiro florestal moçambicano formado na Universidade Eduardo Mondlane e que tinha sido meu aluno. É extremamente gratificante poder passar informações e ajudar na formação de profissionais de países que passam por algumas dificuldades.

FLORESTAL: Conte-nos sobre a realização dos levantamentos florestais no Acre e Roraima?

EVALDO: Essa experiência me ajudou a ter uma visão mais geral sobre a Floresta Amazônica. Trabalhei no inventário da BR 364, no Estado do Acre, junto a FUNTAC (Fundação de Tecnologia do Estado do Acre), onde fizemos um levantamento ao longo de todo o caminho das subtipologias florestais, que lá existiam. As informações levantadas no trabalho foram publicadas ainda no ano de 1994. Em Roraima, foi feito um levantamento ao longo de um dos maiores rios do Estado. Esses levantamentos deram embasamento para o que faço até hoje, muito conhecimento sobre a floresta e aumentou ainda mais o desejo de trabalhar nas florestas naturais brasileiras.

FLORESTAL: Qual a importância do manejo sustentável para as florestas e para a economia?

EVALDO: O manejo tem grande importância para os Estados que pertencem à Floresta Amazônica. Para economias microrregionais dentro desses Estados como gerador renda para os municípios e é um grande gerador de emprego também. Mas acima de tudo, o manejo florestal é o único uso do solo que mantém a cobertura florestal praticamente intacta e a única proposta de uso econômico, que mantém a floresta em pé. É o único uso plenamente sustentável para o bioma.

FLORESTAL: Como a pesquisa florestal pode trazer novas soluções para o setor florestal?

EVALDO: A pesquisa sobre o manejo florestal contribui de forma essencial. Atualmente temos uma legislação que permite uma taxa padrão de extração para todos os diferentes locais na Região Amazônia. A Amazônia é gigantesca e tem diferentes potencialidades, dependendo das condições locais ou distribuição das espécies. A pesquisa surge como uma possibilidade de desenvolver novos procedimentos para manejar espécies. Primeiro, conhecendo melhor as espécies, pois quanto mais informações temos sobre a árvore, melhor a forma de usufruir da madeira e preservar a continuidade daquela espécie. Por isso, a pesquisa serve para informar sobre as árvores de cada região, sobre a maturidade dos indivíduos ali presentes, isso faz com que a intervenção nessa floresta seja muito mais assertiva e produtiva. Utilizar uma mesma norma geral é um empecilho para o desenvolvimento do trabalho do manejo, pois as espécies apresentam comportamentos, ciclos e resultados diferentes. A pesquisa sobre manejo abre as possibilidades para que a legislação possa ser alterada e aplicada da melhor maneira possível.

FLORESTAL: Como mostrar a importância do manejo sustentável da floresta para a sociedade?

EVALDO: Na verdade existe uma grande confusão entre manejo, exploração florestal e desmatamento, A grande mídia também acaba fazendo confusão entre os termos, e isso prejudica a visão da sociedade sobre manejo. O manejo precisa ser mais divulgado, mais explicado para sociedade civil, para que a importância e seriedade do manejo possam ser entendidas. O manejo respeita a floresta, tem padrões para ser realizado e preserva fauna e flora local como nenhuma outra atividade. O manejo é uma garantia de preservação para a floresta. É importante mostrar para a sociedade e para produtores rurais que tenham interesse que o manejo é a única atividade que não altera ambiente, pois remove algumas árvores e mantém a maioria intacta.

FLORESTAL: O manejo é a chave para manter a floresta em pé?

EVALDO: O manejo é a chave para manter a floresta em pé para sempre. Perenemente, porque o princípio do manejo é só cortar árvores depois que ela atingir um determinado ponto de maturação e toda parte estrutura de baixo mais jovem, mais saudável, fica em pé. Ou seja, após a remoção das árvores mais velhas, só podemos voltar na mesma área em 25 ou 30 anos. Assim, teremos novas árvores para realizar um novo corte, mas a estrutura da floresta fica mantida.

 FLORESTAL: Qual a importância da EMBRAPA Florestas para a pesquisa e desenvolvimento das culturas florestais e manejo no Brasil?

A EMBRAPA foi criada para aliar a questão ambiental e produtiva, temos essa pegada de produção florestal como um norte no trabalho. Trabalhamos com florestas nativas e também nas melhorias para o desenvolvimento de espécies de reflorestamento. Na minha área, de manejo de espécies nativas, temos nossa maior área de pesquisa no Mato Grosso, onde existem grandes áreas de manejo sendo exploradas. Nossa área de pesquisa, por exemplo, da EMBRAPA Florestas é no Mato Grosso. Temos parceria, também com a EMBRAPA do Acre e buscamos, como pesquisadores, oferecer soluções melhores para a produção.

FLORESTAL: Existem parceiras público privadas no desenvolvimento das pesquisas?

 EVALDO: A EMBRAPA têm várias é parcerias. No manejo trabalhamos junto com o CIPEM (Centro das Indústrias Produtoras e Exportadoras de Madeira do Estado do Mato Grosso) e com o SINDUSMAD/Norte (Sindicato da Indústria Madeireira do Norte do Estado do Mato Grosso). Essas pesquisas funcionam em uma rota de mão dupla. As associações nos apoiavam e em contrapartida recebem informações de interesse para suas atividades. Trabalhamos para expandir essas parcerias em outros Estados e atividades.

FLORESTAL: O Brasil pode ser uma potência no manejo e exportação de madeira nativa?

EVALDO: Acredito que sim. Vemos alguns trabalhos que consideram que não, que não seria sustentável para suprir uma demanda mundial. Entretanto são poucas áreas até agora que são estão sendo destinadas a manejo florestal e nessa lacuna temos um potencial enorme, com a Floresta Amazônica, mas também se tivermos expansão para outras florestas nacionais. Precisamos trabalhar para diminuir o preconceito com o manejo e mostrar que quanto mais florestas manejadas, mais florestas teremos em pé e menos áreas serão destinadas à culturas que afetem o bioma de forma mais pesada.

FLORESTAL: Quais as principais mudanças observa em relação ao manejo realizado quando começou nessa área e atualmente?

EVALDO: Antigamente o manejo era feito de exploração sem o adequado planejamento. Havia muita destruição da floresta que permanecia e isso afetava também a regeneração da área de manejo. A legislação e as pesquisas foram grandes aliadas no desenvolvimento do manejo florestal. A evolução da exploração madeireira saiu de um extrativismo simples, onde a pessoa ia lá e tirava a árvore, para um sistema planejado, onde toda extração é controlada pelos órgãos fiscalizadores. Hoje há um controle muito maior sobre a atividade, sistemas de rastreamento da madeira desde seu corte, até o destino final do produto.

FLORESTAL: Qual é seu maior objetivo como pesquisador?

EVALDO: Objetivo como pesquisador é dar respostas para a sociedade. Respostas que contribuam para a sociedade e, especificamente para mim, é diminuir o preconceito que existe em relação ao manejo e contribuir para que a legislação e os métodos de manejo se aperfeiçoem.

Entrevista da REFERÊNCIA FLORESTAL, edição 245.

foto:divulgação

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