O Mogno Africano é uma espécie inserida no Brasil há 40 anos, mas que que na última década ganhou muito mais atenção e espeço dentro do mercado de reflorestamento. Esse crescimento se deve ao trabalho realizado por Patrícia Alves Fonseca, diretora-executiva da ABPMA (Associação Brasileira de produtores de Mogno Africano), que desde sua fundação trabalha para disseminar e valorizar o Mogno Africano no Brasil.
– Como foi fundada a ABPMA?
A Associação nasceu da união de alguns produtores de Mogno Africano que começaram a plantar e buscaram nessa união uma forma de aprender mais e ter mais informações sobre uma árvore que já estava apresente no Brasil, mas não em plantios comerciais. No início eram em torno de 5 produtores das regiões Sudeste e Centro-Oeste, mas hoje, depois de 10 anos de início da ABPMA, os plantios da espécie já estão presentes em todas as regiões do país.
REFERÊNCIA: Como foi sua chegada à diretoria-executiva da ABPMA?
Patrícia: Na época da fundação da associação eu já trabalhava na empresa de um dos fundadores e atual presidente da ABPMA, Ricardo Tavares. O convite para assumir a diretoria-executiva veio através do próprio Ricardo, pois ele buscava alguém de confiança para ficar responsável por direcionar e gerir as atividades da ABPMA em tempo integral. Na época, confesso, eu conhecia pouco ou quase nada sobre plantios de Mogno Africano e assim iniciei um grande processo de aprendizado. Eu sou responsável pela parte operacional da ABPMA, enquanto a presidência foca no contato entre os nossos membros.
REFERÊNCIA: Como foi a introdução e popularização do Mogno Africano no Brasil?
Patrícia: O Mogno Africano chegou ao Brasil através de plantios da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) a pouco mais de 45 anos realizados no Pará. Dessas árvores da saíram a maioria das sementes que fazem os plantios do país. Essas sementes foram disseminadas inicialmente no próprio estado do Pará, na tentativa de popularizar a espécie entre produtores locais. Como o clima da região era muito semelhante ao local de origem da espécie, o desenvolvimento foi ótimo. Agora, a chegada do Mogno Africano em outras regiões era uma incógnita, pois a variação climática do Brasil é muito grande e quando a espécie foi levada para outras regiões, como sudeste e centro-oeste, não sabíamos como seriam os resultados. Entre os produtores membros da associação foi algo bem experimental e corajoso por parte dos produtores. Essa coragem e força de vontade ajudaram muito na popularização dos plantios que hoje estão presentes até mesmo em estados do Sul, como o Paraná. Em relação a popularização o trabalho da associação, focado em muitas conversas e informações de qualidade sobre o Mogno Africano fez a espécie se tornar tão conhecida. Esse trabalho de pequenos passos tem dado grandes resultados. Hoje já temos literatura suficiente para garantir os bons resultados no início do plantio do Mogno Africano. Como não completamos um ciclo completo de plantio, desbaste e corte, que acontece apenas a partir dos 18 anos da árvore, temos aproveitado cada momento para aprender e ajudar os outros membros.
REFERÊNCIA: A ABPMA trabalha com pesquisa laboratorial da espécie?
Patrícia: Temos vontade de trabalhar com isso, mas os custos desse tipo de pesquisa ainda atrapalham um pouco. Dentro da associação temos um grupo voltado à pesquisa com todos os pesquisadores brasileiros que estudam a espécie. No momento estamos realizando um trabalho sobre desbaste da árvore para o processo de comercialização da madeira. Em relação à genética já temos alguns resultados catalogados, mas não podemos afirmar que temos trabalhos de melhoramento genético. Além disso, os testes genéticos para melhoria de produção e resultados levam pelo menos um ciclo completo de plantio e ainda temos mais 7 ou 8 anos até conseguirmos fechar o primeiro ciclo de quem plantou junto à fundação da associação. Algo que buscamos e apoiamos muito no momento são pesquisas governamentais feitas em universidades. No ramo da genética buscamos melhorar algumas características que valorizam o valor final da nossa madeira, como a redução de tortuosidade do caule, para a retirada de tábuas mais longas.
REFERÊNCIA: Existe apenas uma espécie de Mogno Africano plantada no Brasil?
Patrícia: Em relação a espécie temos uma situação que foi aclarada há pouco tempo. Tivemos muitas sementes que vieram para o Brasil na clandestinidade e isso gerou uma mistura de espécies de mogno Africano. Desde o início pensávamos que havia uma predominância de Khaya Ivorensis no país, mas foi verificada que a espécie era na verdade Khaya Grandifoliola, uma espécie muito próxima da Ivorensis. Para chegar a essas conclusões, trouxemos para o país o maior pesquisador de Mogno Africano do mundo e descobrimos também que essas novas sementes deram ao país cruzamentos novos, que podem ter gerado uma nova espécie. Claro, essas árvores ainda precisam ser melhor estudados para entender quais melhoramentos para a espécie foram agregados ao Mogno produzido em nosso país. Isso tudo serviu para não apenas identificarmos, mas sim para podermos oferecer para os nossos compradores madeira de qualidade, certificada e com verificação da espécie, que valoriza o produto final.
REFERÊNCIA: Qual a posição do Brasil no mercado mundial de Mogno africano?
Patrícia: Não podemos afirmar com certeza, pois os dados que temos dentro da ABPMA são apenas dos nossos associados. Isso representa um valor que supera os 50 mil há (hectares) plantados no país. Outro dado que temos é que grande parte da produção está em Minas Gerais. Essa informação é algo que atualizamos continuamente. Explico, muitos produtores não associados nos procuram na época de desbaste, 10 a 12 anos de plantio, e é nesse momento que tomamos conhecimento das plantações e do volume de produção que temos no país. Nosso intuito é fazer do Brasil o maior produtor de mogno africano do mundo. Para isso temos que garantir que podemos atender o mercado interno e externo de madeira. O mercado externo não fecha negócio sem a garantia de que terá a matéria-prima continua para atender suas necessidades. O mogno é uma commodity que precisa de reposição. Na África já existem restrições ao corte da madeira, devido a exploração predatória que levam a escassez, e isso coloca o Brasil com boas oportunidades de expansão. Uma ótima notícia que tivemos recentemente é que um dos nossos associados fechou uma parceira com um dos maiores fundos de investimentos do mundo para o plantio de Mogno Africano no Brasil. O plantio que será realizado até 2025 terá 10 mil há em apenas uma propriedade e pode ser tratado como maior plantio de mogno africano do mundo.
REFERÊNCIA: Quais as vantagens em se associar?
Patrícia: As vantagens são impalpáveis. Nós não temos uma prestação de serviço ou algo do tipo, pois vamos em outro caminho. O que fazemos é unir experiências de diferentes lugares para que os produtores tenham acesso as melhores técnicas já desenvolvidas, seja em produção, manejo, irrigação e afins. Temos duas reuniões presenciais por ano para fomentar o contato e amizade entre os produtores. Por exemplo, o processo de desbaste do Mogno Africano é completamente personalizado e diferente de outros plantios de reflorestamento. A serraria, poda e corte fogem do que estamos habituados. Esses contatos e trocas de experiência servem para que todos os produtores possam ter os melhores resultados em suas propriedades. E isso nos leva a parte mais importante disso tudo: rentabilidade. Quem definiu o preço da madeira foi a associação. Nós trabalhamos muito para que fosse criada uma imagem positiva e de luxo sobre o mogno africano. Nós criamos o conceito “Mogno Africano: Objeto de desejo”, em que trouxemos grandes designers e levamos os produtos para feiras e eventos voltados a classes com alto poder de aquisitivo e mostramos que é uma madeira de alto nível voltada a produtos de luxo.
REFERÊNCIA: Quais cursos vocês promovem? Como são escolhidos os temas?
Patrícia: Todas as reuniões são como pequenos cursos. Nós vamos até a fazenda de um de nossos associados e durante dois dias temos atividades com foco em informações técnicas. Nas sextas-feiras apresentemos palestras e aos sábados realizamos ações de campo. Fizemos também workshops muito grandes, para mais de 600 pessoas, sempre com intuito e informar e aproximar os produtor. Atualmente realizamos eventos menores, para atender diretamente nosso associado, que já tem acesso a muita informação e assim ele passa isso para quem está chegando agora. O trabalho da ABPMA ajudou também a fomentar muito a curiosidade dos estudantes e pesquisadores, que hoje contribuem para o melhor desenvolvimento do Mogno Africano no país.
REFERÊNCIA: Dentro da associação existem cinco grupos distintos de trabalho: Pesquisa, Comercialização, Técnico, Mídia/Digital e Investimentos/Financiamento. Como funcionam esses grupos?
Patrícia: Há alguns anos percebi que não poderia ficar com todas as atividades da associação, pois me sobrecarregava. Percebi também que para que a associação fosse realmente uma associação de produtores, no sentido mais direto, era necessário que os associados participassem mais das atividades. Por isso, esses grupos foram formados por mim, selecionando os associados que mais se enquadravam nos aspectos de cada um dos temas e cada um pode agregar conhecimento e experiência dentro de áreas que já tem expertise.
REFERÊNCIA: Qual a principal conquista da ABPMA nos primeiros 10 de atuação?
Patrícia: A formação de um mercado interno de Mogno é nossa maior conquista. Hoje já temos um embasamento para o trabalho que realizamos. Quem planta o Mogno faz isso para cortar e ter rentabilidade no mercado. A associação está conseguindo garantir esse mercado.
REFERÊNCIA: Quais os planos para o futuro da ABPMA?
Patrícia: Nosso próximo passo é levar o Mogno Africano para os polos moveleiros, e para isso precisamos de mais madeira. Se pensarmos no potencial da madeira nobre é algo muito grande. Nossos passos são graduais, por isso precisamos ir com calma, para apresentar nosso produto para essas empresas e garantir que esse negócio tenha boas garantias. Nosso objetivo é conquistar mais mercado e oferecer mais produtos. Queremos mostrar cada vez mais nosso produto e fazer o Mogno Africano uma referência de madeira nobre. Hoje somos um produto conhecido no mercado da madeira e queremos fazer ele ainda maior.
Entrevista da REFERÊNCIA FLORESTAL, edição 237.